Bruno Takahashi C. de Oliveira

Textos / Paradoxos Intrigantes

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Eis aqui uma série de paradoxos desconcertantes. O campeão em termos de 'desconcertância' é o do prisioneiro, que apresento primeiro.

Paradoxo do Prisioneiro

Num domingo, o carrasco entra na cela de um prisioneiro e lhe diz que ele será executado naquela semana, no mais tardar no sábado. O prisioneiro pergunta quando exatamente, e o carrasco, com um sorriso malévolo, simplesmente responde: "Garanto que será num dia em que você não esteja esperando ser executado."

O prisioneiro sabe que será executado num dos seguintes dias: domingo, segunda, terça, quarta, quinta, sexta ou, no mais tardar, no sábado. Mas ele raciocina o seguinte: se no início do sábado ele ainda estiver vivo, terá a certeza de que será executado no próprio sábado, violando o que o carrasco lhe garantiu (i.e. que a execução seria num dia no qual ele não estaria esperando ser executado). Portanto o prisioneiro já exclui o sábado das possibilidades. Sabendo disso, ele pode ser executado no domingo, na segunda, na terça, na quarta, na quinta ou na sexta.

Mas aí ele percebe o seguinte: uma vez que ele não pode ser executado no sábado, se no início da sexta-feira ele ainda estiver vivo, ele terá de ser executado na sexta-feira (pois se o carrasco esperar até sábado, o prisioneiro estará esperando ser executado). Portanto, ele estará esperando ser executado na sexta, o que novamente viola a garantia do carrasco.

Logo ele não pode ser executado nem na sexta nem no sábado, pois em ambos os casos ele estaria esperando ser executado. Repetindo o raciocínio para quinta-feira, ele descobre que ele também não pode ser executado na quinta-feira. Repetindo mais vezes o raciocínio, acaba concluindo que não pode ser executado em nenhum dia da semana! Sabendo disso, ele respira aliviado.

Aí entra o carrasco e diz "Vou executá-lo agora." O prisioneiro protesta, dizendo que ele havia garantido que seria inesperado. "E não é?" Pergunta o carrasco, levando-o ao patíbulo.

Estranho, não?

Paradoxo de Russell

Esse é um paradoxo matemático, então esteja preparado para um assunto meio seco...

Vou propor um axioma, e você vai me dizer se faz sentido: "Para qualquer propriedade p, existe o conjunto de todas as coisas com essa propriedade."

Parece correto? Lógico, pois para qualquer propriedade que você pensar, sempre existirá o conjunto de todas as coisas com essa propriedade, mesmo que seja um conjunto vazio. Assim, se a propriedade for "ser uma pessoa", o conjunto seria composto de todos os 6 bilhões de habitantes do planeta (e mais os astronautas na International Space Station). Mesmo que a propriedade seja absurda, como "ser um animal sem células," ainda existirá o conjunto: será vazio, mas existirá.

Se eu te convenci, desculpe. A verdade é que o axioma é falso! Existem propriedades para as quais não existe o conjunto de todas as coisas com a aquela propriedade. Não estou dizendo que o conjunto é vazio, estou dizendo que o conjunto não existe mesmo, pois se existisse, mesmo vazio, seria um absurdo.

Qual é esse conjunto? Antes de explicar, preciso apresentar a definição de conjunto extraordinário.

Conjunto extraordinário: É todo conjunto que pertence a si próprio. Por exemplo, o "conjunto de todos os conjuntos" é um conjunto extraordinário, pois é um membro de si mesmo.

Conjunto ordinário: É todo conjunto que não pertence a si próprio. A maioria dos conjuntos com os quais estamos acostumados a lidar é ordinário. Por exemplo, o conjunto de todas as pessoas não é, em si, uma pessoa, e por isso é ordinário.

Agora vamos dizer que a propriedade p é a seguinte: "ser um conjunto ordinário". Existe o conjunto S de todas as coisas com essa propriedade, isto é, o conjunto de todos os conjuntos ordinários?

Se a resposta foi sim, considere o seguinte: Se existir o tal conjunto S, então ele contém todos os conjuntos ordinários, isto é, um conjunto é ordinário se e somente se pertencer ao conjunto S. Certo?

Mas e o próprio conjunto S, é ordinário ou extraordinário? Vamos considerar cada possibilidade.

Se S for ordinário: Bom, se S for ordinário, quer dizer que ele não pertence a si mesmo. Mas dissemos que um conjunto é ordinário se e somente se pertence a S, logo se S não pertence a si mesmo, não pode ser ordinário! Ou seja, S não pode ser ordinário.

Se S for extraordinário: Se S for extraordinário, quer dizer que pertence a si mesmo. Mas dissemos que um conjunto é ordinário se e somente se pertence a S, logo se S pertence a si mesmo, então S é ordinário!

Aí está o absurdo: se supusermos que S é ordinário, chegamos à conclusão que S é extraordinário; e, se supusermos que S é extraordinário, chegamos à conclusão que S é ordinário!

Este é o famoso Paradoxo de Russell.

Por isso, para uma dada propriedade p, não existe necessariamente o conjunto de todas as coisas com essa propriedade.